
Paulo Coelho
Depois de uma pequena introdução ao que são os hippies, este livro conta a história de dois deles - a Karla e o Paulo - e a aventura que vivem de Amesterdão até Katmandu, no Nepal. Cada personagem tem a sua razão, ou razões, para iniciar esta viagem, o que vamos descobrindo ao longo do livro.
Um facto que achei interessante - e que não sabia - é que os hippies, quando viajavam para outras terras, vendiam o passaporte a pessoas parecidas para terem dinheiro e prolongarem a viagem. Depois, podiam simplesmente pedir outro ao consulado.
Nestas primeiras cem páginas, passamos a conhecer melhor a história das duas personagens e acompanhamos, do ponto de vista de ambos, a evolução da relação entre eles. Gostei particularmente da apresentação das personagens feita separadamente, antes de se encontrarem. Primeiro descobrimos um pouco sobre a Karla, depois sobre o Paulo, depois sobre a Klara, e assim sucessivamente até ao encontro deles em Amesterdão, na Praça Dam.
Demorei algum tempo até ficar verdadeiramente agarrado à história - penso que as diferenças entre as personalidades e as ações das personagens não despertaram logo a minha curiosidade.
Intriga-me o facto de as pessoas poderem - de um dia para o outro - largar a vontade de uma vida estável, que consideram aborrecida ou injusta, para se dedicarem a certas atividades deste movimento.
Algumas são muito legítimas e generosas: querer viajar pelo mundo e trabalhar em troca de cama e comida, ajudando em restaurantes ou pessoas que necessitam. Por outro lado, também existe a presença de drogas devastadoras (erva sendo comum), como o LSD, que deixa a pessoa totalmente incapaz de se controlar e faz com que necessite de ter alguém por perto. Gostei que uma das personagens (fora das principais) tenha decidido experimentar e percebido o perigo, o que lhe mudou completamente a visão e os motivos pelos quais se tinha juntado à viagem. No entanto, acho que não deveria ser necessário passar pela experiência para chegar a essa realização. Imagino que cada pessoa evolui num ambiente que a pode sujeitar a más influências, más experiências, ou uma educação pobre.
O livro desenvolve muito o lado espiritual - cada um tenta entrar em contacto consigo próprio, perceber o seu lugar no mundo. É uma resposta que muitos procuram, nesta viagem, nesta aventura. As pessoas costumam dizer que o Paulo Coelho consegue escrever numa “língua universal”. Começo a compreender melhor esse termo porque, em Hippie, isso é bastante claro: em termos de religiões ou crenças, ele expõe todas - Igreja, Islão, sufismo, ateus, ou até pessoas que acreditam num ser que não se enquadra em nenhuma dessas categorias. Assim, toda a gente pode (de certa forma) identificar-se com o livro. Notarás isso nas citações que escolhi para guardar.
TL;DR: é um tema que achei um pouco menos interessante, mas aprendi ideias e termos novos; acabei por interessar-me pelo desenvolvimento das personagens (que não vou spoil). Estou curioso por saber se os outros livros do Paulo Coelho continuam a seguir esta procura espiritual que tantas pessoas partilham.
Misericórdia - apesar de ouvir esta palavra tantas vezes, quis guardar aqui a definição: a disposição para perdoar, compreender e agir com compaixão perante o erro, a fraqueza ou o sofrimento de alguém.
Ostensivamente - fazer algo ostensivamente é fazê-lo de propósito para que todos vejam.
Exemplo: Ele estava a ser ostensivamente irónico.
Mazdak e o Hippismo: Mazdak foi um reformador social que viveu na Pérsia por volta do ano 480 d.C. Fundou um movimento que pregava a partilha de bens e a igualdade entre todos, acreditando que a injustiça e o sofrimento provinham da ganância e da desigualdade. Defendia uma vida comunitária baseada no amor universal, na solidariedade e na rejeição do egoísmo — ideias que mais tarde ecoariam no movimento hippie do século XX.
O hippismo, surgido nos anos 1960, também rejeitava o materialismo e as hierarquias, promovendo a paz, a liberdade e a vida em comunidade, em harmonia com a natureza.
Filosofia grega – os Cínicos: Os cínicos foram uma escola filosófica da Grécia Antiga, fundada no século IV a.C. por Antístenes, discípulo de Sócrates, e mais tarde desenvolvida por Diógenes de Sínope. Acreditavam que a felicidade e a virtude estavam na simplicidade e na autossuficiência, defendendo o desprendimento dos bens materiais e das convenções sociais. Viviam de forma austera e provocadora, para mostrar que a verdadeira liberdade vinha de depender apenas de si próprio e da razão, não das opiniões ou regras impostas pela sociedade.
Cinismo (hoje): O cinismo, no sentido moderno, perdeu o caráter filosófico original e passou a designar uma atitude de desconfiança em relação aos valores e às intenções humanas. O cínico contemporâneo tende a ver hipocrisia e interesse pessoal em todas as ações, desprezando ideais como a bondade, a sinceridade ou o altruísmo.
Esta pesquisa começou quando Paulo Coelho falou dos cínicos gregos, e fiquei curioso sobre a relação entre essa filosofia antiga e o cinismo moderno. Enquanto o cinismo antigo procurava libertar o ser humano das ilusões sociais para viver com virtude e autenticidade, o moderno vê nas ilusões a única coisa que existe.
Anima Mundi - conceito filosófico que descreve uma “alma do mundo”, uma força vital universal que conecta e anima todos os seres e elementos do universo. Representa a ideia de que tudo está interligado por uma consciência ou essência espiritual comum.
"Conversa com o coração porque as palavras são apenas acidentais, e, embora precises delas para comunicar com os outros, não te deixes trair por significados e explicações."
- Página 157
"As pessoas ouvem apenas aquilo que querem, nunca tentes convencer ninguém, segue apenas o teu destino sem medo, ou até mesmo com medo, mas segue o teu destino."
- Página 157
"Os templos, as igrejas e as mesquitas estão cheios de pessoas com medo do que está do lado de fora e que acabam por ser doutrinadas por palavra mortas."
- Página 158